A partir de certo patamar de atividade, as pessoas deixam de ser apenas elas próprias e passam a ser uma espécie de entidade coletiva, através da qual outras [pessoas] também falam e agem.
É nesta perspectiva que, embora esteja deprimido e enfurnado no Palácio da Alvorada, Jair Bolsonaro continua a falar e a agir através de terceiros, não só investindo na formação de uma legião de bolsonaristas desmiolados e preparando um eventual golpe militar (dizem que seu antigo comitê eleitoral foi transformado em QG do golpe, reunindo a mais fina-flor dos ‘intervencionistas’ para a articulação dos bloqueios rodoviários e manifestações anti-democráticas), mas, também, cuidando para projetar seu governo (e o ultraliberalismo) sobre o futuro, através da presença efetiva na gestão pública.
Com efeito, depois de dar independência ao Banco Central (providência considerada pelos liberais como ‘a grande sacada’), fazendo a nomeação do ultraliberal Roberto Campos Neto (cujo mandato só expirará na metade do governo Lula), e nomear coronéis bolsonaristas para o generalato, dando-lhes um ‘mandato’ que pode alcançar os 12 anos, e indicar juristas bolsonaristas para os tribunais superiores – inclusive Kássio Nunes e André Mendonça para o STF -, Bolsonaro vem tratando de ampliar a sua presença nos futuros governos.
Foi neste sentido que, neste finalzinho de governo, indicou e trabalhou pela eleição de Ilan Goldfajn para a presidência do BID, cujo mandato é de 5 anos, e, talvez no gesto mais acintoso, nomeou o ex-ministro do Turismo Gilson Machado para a presidência da Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur), cujo mandato é de 4 anos. Este processo ainda avança, inclusive no Senado, onde são apreciadas as indicações dos desembargadores Messod Azulay e Paulo Sérgio Domingues feitas por Bolsonaro para o Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Uma coisa é certa: com golpe ou sem golpe, com maior ou menor intensidade, o espectro de Bolsonaro ainda vai perturbar a vida dos brasileiros por muito tempo.