Era jovem, forte, saudável e se julgava esperto e inteligente.
Acreditava nos encantos da liberdade e da meritocracia.
Como seu avô dizia, ‘quem não tem competência não se estabelece’.
Estava pronto para a vida.
Nunca votara na Esquerda e, assim como seus colegas, apoiara o Impeachment de Dilma Roussef. Nunca relacionou a perda do emprego (e, com ele, o seguro saúde, as férias, o 13º, o vale-transporte e o salário) ao novo governo.
Aquilo deveria ser consequência dos ‘desmandos do governo do PT’.
Mas, não tinha problema.
Se não tinha emprego, ele seria empreendedor: agregaria o seu carro ao Uber e, sem precisar prestar contas a ninguém, seria seu próprio patrão.
E foi assim.
Só teve problema quando ficou sem faturar por alguns dias – numa vez precisou parar para consertar o carro que fora arranhado por motoboy e, na outra, não pode trabalhar, pois estava adoentado.
Coisas da vida de empreendedor.
Mesmo assim, continuou o mesmo, sempre apoiando o novo governo e se mantendo firme na Direita, ao lado dos amigos patriotas, e combatendo a Esquerda.
Temendo que os ‘comunistas’ expropriassem seu carro (do qual tirava o sustento), votou em Jair Bolsonaro, depois em Tarcisio de Freitas e, para expurgar sua terra da canalha da esquerda, reconduziu o prefeito Ricardo Nunes.
Agora, tentado a mudar de profissão e voltar a trabalhar como empregado (e recuperar as férias, o 13º e as outras coisas), pois a economia do País melhorou, continua a falar mal das Esquerdas, mas começou a ficar sem resposta quando acusam seu time de ser responsável por uma porção de mazelas.
Não tem problema.
Ele é direita-raiz e não mudará seu modo de pensar.
Só não gosta quando chove, pois, além da cidade alagar, falta energia elétrica por vários dias e, como mora num andar alto, precisa subir as escadas e termina por faltar água.
Mas, firme e consistente, ele já se habituou à situação e só não gostou do dia que, numa blitz da polícia, foi confundido com um vagabundo e, antes de esclarecer a confusão, levou umas boas bordoadas.
Nada disso, no entanto, abala o seu patriotismo e sua ojeriza à Esquerda.
Um velho ensinamento diz que, colocada numa panela e submetida ao fogo brando, sem perceber o perigo, a rã morre cozida.
É o caso desse cara, que, pelo jeito, nasceu com o destino dos cachimbos (que nasceram para leva fumo).
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