Há ‘séculos’ ingressei no mundo literário com a publicação de ‘Os retirantes’ – um despretensioso ensaio sociológico que abordava a questão das migrações internas no Brasil, envolvendo a vida de pobres em fuga da miséria para constituir um grande contingente de uma espécie de refugiados em seu próprio país. Anos mais tarde, já na condição de presidente do Clube de Engenharia de Pernambuco, publiquei uma série de artigos sobre o déficit habitacional, abordando, inclusive, a situação de abandono vivida pelos pobres e miseráveis – vítimas preferenciais das catástrofes e vítimas exclusivas dos frequentes incêndios ocorridos em favelas. Estes escritos não abordavam coisas inéditas, tratavam da vida dos excluídos, retirantes e refugiados internos. Se referiam a situações do dia-dia, que, infelizmente, por conta das prioridades da mídia, nunca mereceram a devida atenção pela opinião pública e foram incorporados à paisagem, como se fossem coisas normais. Agora, decidida a desviar a atenção das pessoas das verdadeiras razões da guerra, vejo a mídia concentrada em destacar o sofrimento dos retirantes ucranianos deslocados pela perspectiva de violência. Lembrado do desdém dado pela mídia aos ‘refugiados internos’ do Brasil, passo a duvidar das reais intenções do noticiário. A imprensa deve ser livre, mas deve usar a liberdade (que precisa ter) de forma responsável, de modo a manter a credibilidade e justificar sua própria existência como elemento fundamental para o funcionamento da Democracia.
Autor: Alexandre Santos
Alexandre Santos é engenheiro e escritor. Preside a Associação Brasileira de Engenheiros Escritores, presidiu o Clube de Engenharia de Pernambuco e a União Brasileira de Escritores e faz a coordenação nacional da Câmara Brasileira de Desenvolvimento Cultural. Autor premiado com livros publicados no Brasil e no exterior, Alexandre é o editor geral do semanário cultural ‘A voz do escritor’ e diretor-geral do canal ‘Arte Agora’.