Ontem, ao contrário daquilo que suspeitavam alguns, não houve o ‘sequestro seguido de morte’. Houve apenas o sequestro.
De fato – embora, em episódio surrealista, bem ajustado às maluquices vividas pelos brasileiros nestes estranhos tempos de presença fascista no governo, tenha havido o sequestro das comemorações do Bicentenário da Independência do Brasil para servir de propaganda eleitoral para Jair Bolsonaro, não houve o temido golpe de Estado.
Diante da possibilidade pior, mesmo sabendo que o risco não desapareceu, o Brasil acordou aliviado. Naturalmente, o sequestro das comemorações foi um crime imperdoável e, no tempo devido, deverá implicar em severas penas aos responsáveis.
De qualquer forma, sob todos os aspectos, o episódio protagonizado ontem por Jair Bolsonaro foi um fiasco.
Do ponto de vista eleitoral, as manifestações ocorridas em algumas cidades do País, foram inócuas, pois, além de não conseguir sensibilizar qualquer pessoa que já não estivesse na chamada ‘bolha bolsonarista’, Bolsonaro irritou muita gente, especialmente as mulheres, que sentiram-se ofendidas com o discurso grosseiro e misógino do presidente.
Aliás, por saberem dos propósitos de Bolsonaro, os presidentes Arthur Lira, da Câmara, Rodrigo Pacheco, do Senado, e Luiz Roberto Fux, do Supremo Tribunal Federal, os ex-presidentes da república e os governadores não compareceram aos atos, reduzindo a sua importância política e circunscrevendo-os ao limites paroquianos do bolsonarismo.
Bolsonaro transformou as comemorações do Bicentenário num ‘encontro de amigos’, garantindo espaço para a famiglia e figuras execráveis como Fabrício Queiroz, Daniel Silveira e Luciano Hang – cuja presença diz muito sobre aquilo que aconteceu. Vale o registro de que, na festa de Bolsonaro, quem ficou deslocado foi o presidente português Marcelo Rebelo – que, esperando participar de uma Solenidade de Estado, compareceu ao evento de Brasília e, mais uma vez, foi desrespeitado por Jair Bolsonaro, sendo colocado em posição secundária no dispositivo de honra, preterido pelo empresário golpista Luciano Hang.
O sequestro do Bicentenário da Independência é um crime a mais que se soma à vasta folha corrida de Jair Bolsonaro, que, um dia, vai responder por cada um deles.