Com a redemocratização do Brasil, os setores mais engajados no enfrentamento ao regime militar passaram a cobrar a realização de uma Justiça de transição – conjunto de medidas políticas e jurídicas necessárias para a reparação dos direitos humanos violados durante os anos de chumbo.
Um vislumbre sobre a série ‘64+60 Vozes da Resistência’ com entrevistas tomadas a alguns dos guerreiros da resistência ao golpe de 1º de abril de 1964 (Amaury Monteiro Jr, Jean Marc von der Weid, Antônio Luiz Rocha, Ivanisa Teitelroit Martins, Marília Guimarães, Mariluce Moura, Carlos Tiburcio, Cajá, Hildegard Angel, Jovenildo Pinheiro, Marcelo Mário Melo, Anacleto Julião e outros igualmente importantes) apresentada pelo Canal Arte Agora, no YouTube, oferece um significativo panorama da crueldade de como, sistematicamente, os agentes da ditadura desrespeitaram direitos humanos no Brasil, deixando claro a necessidade de uma Justiça de transição capaz de fazer valer as leis que garantem a Democracia e os princípios gerais de humanidade.
Aliás, como toque final de perversidade, já nos extertores do regime militar, em 28 de agosto de 1979, o ditador de plantão João Baptista Figueiredo fez aprovar a lei que decretava uma ‘anistia ampla, geral e irrestrita’, beneficiando igualmente torturados e torturadores.
Com o nítido objetivo de obrigar os brasileiros a conviver com assassinos e torturadores (como se fosse possível passar uma borracha sobre a história do País e apagar os crimes contra os direitos humanos cometidos pelos bárbaros), a tal ‘anistia ampla, geral e irrestrita’ igualou guerreiros da Liberdade e da Democracia com reles bandidos e tarados torturadores, equiparando a luta patriótica com a barbárie cometida pelos agentes do golpe.
Embora justificada em nome da cautela dita necessária para garantir a redemocratização do Brasil (segundo disseram, os gorilas ameaçavam reagir caso a anistia não os contemplasse), da forma como foi concedida, a tal anistia ‘ampla, geral e irrestrita’ impede a justiça de transição, não só comprometendo a luta pela Democracia, mas, também, indicando uma transigência cúmplice com a violação dos direitos humanos (crimes, nunca se pode esquecer, imprescritíveis).
Na realidade, a relutância do governo brasileiro em realizar a justiça de transição sinaliza impunidade e, na prática, funciona como estímulo aos golpistas de sempre e serviu de estufa para a movimentação que gerou o Oito de Janeiro e alimenta tantos sonhos golpistas pensados por aí.
De qualquer forma, se a reversão da anistia (da forma como foi adotada) não está possível, então que se reinstale as comissões de Mortos e Desaparecidos, possibilitando à sociedade conhecer a verdade a que tem direito e, inclusive, possa dar funeral digno aos restos mortais de desaparecidos na ditadura.
A retomada dos trabalhos das comissões é fundamental para reafirmar o caráter democrático do governo e ajudar a extirpar espíritos golpistas sempre aninhados especialmente na extrema-direita do espectro político.
Isto é o mínimo que a sociedade brasileira espera neste momento.
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