Depois de quase dois dias em silêncio profundo, estimulando todo tipo de sentimento nas pessoas, pressionado por todas as partes – inclusive pelos seguimentos mais radicais da extrema-direita, os quais, talvez antecipando planos, trataram de começar um movimento de insurgência contra a eleição de Lula a partir da paralisação do transporte rodoviário nas estradas federais -, Jair Bolsonaro se manifestou sobre o pleito presidencial.
Entrincheirado no Palácio da Alvorada e cercado por alguns ministros (a maioria completamente desconhecida, uns poucos baba-ovos, como o capitão-do-mato Hélio Negão, e, ainda, pelo filho 03 Eduardo (os paradeiros dos filhos Flávio e Carlos e da esposa Michele são desconhecidos), Jair Bolsonaro leu uma nota rude, que, de tão curta e tão vaga, a depender do espírito de quem a ler, pode dizer qualquer coisa.
Com efeito, sem referência ao resultado, ao vencedor da eleições ou ao futuro do País, o discurso de Bolsonaro manteve o caráter divisionista, mentiroso e belicoso do seu jeito de ser, agradecendo aos seus eleitores e justificando o movimento nas estradas como ‘fruto de indignação e sentimento de injustiça de como se deu o processo eleitoral’.
Falando da emersão da Direita e do fortalecimento das lideranças que defendem o lema fascista ‘Deus, pátria, família e liberdade’, Bolsonaro se diz ‘líder de milhões de brasileiros’ que ‘defendem a liberdade econômica, a liberdade religiosa, a liberdade de opinião, a honestidade e as cores verde-amarela’ e, reforçando a senha para a ação dos grupos bolsonaristas, arremata: “Nossos sonhos seguem mais vivos do que nunca”.
Aliás, ao contrário daquilo desejado pelos empresários, Bolsonaro não condenou o movimento de paralisação dos transportes rodoviários nas estradas.
Pelo contrário.
Depois de ressalvar que ‘as manifestações pacíficas sempre serão bem-vindas’, Bolsonaro estimulou a divisão ideológica com mais lenha, dizendo que ‘os nossos métodos não podem ser os da esquerda, que sempre prejudicaram a população, como invasão de propriedades, destruição de patrimônio e cerceamento do direito de ir e vir”.
Ou seja: o vale-tudo está autorizado pelo chefe. Vale destacar ainda que dois gestos complementaram o discurso de Bolsonaro: na sequência, em pronunciamento proferido da mesma tribuna usada pelo presidente, o ministro-chefe da Casa Civil Ciro Nogueira anunciou ter sido autorizado a iniciar o processo de transição (entre os governos) e, pouco depois, em encontro arranjado às pressas, Jair Bolsonaro correu ao Palácio da Justiça, na Praça dos Três Poderes, onde reuniu-se com ministros do Supremo Tribunal Federal, a quem, sem usar palavras, suplicou clemência nos julgamentos que o aguardam e podem joga-lo atrás das grades por longo período.
De qualquer forma, sabendo que enfrentará sérios problemas com a Justiça quando retornar à planície em 31 de dezembro, Bolsonaro ainda tem dois meses para gozar da proteção conferida pelo cargo, tempo suficiente para sonhar em ser o grande líder da extrema-direita do Brasil, em planejar a fuga da cadeia ou, mesmo, em aprender alguma coisa com a desenvoltura como Lula organiza o governo e recompõe a política externa brasileira.